Sobre o sentido oculto das coisas

O mistério das cousas, onde está ele?
Onde está ele que não aparece
Pelo menos a mostrar-nos que é mistério?
Que sabe o rio disso e que sabe a árvore?
E eu, que não sou mais do que eles, que sei disso?
Sempre olha para as cousas e penso no que os homens
[pensam delas,
Rio como uma regato que soa fresco numa pedra.
Porque o único sentido oculto das cousas
É elas não terem sentido oculto nenhum,
É mais estranho do que todas as estranhezas
E do que todos os sonhos de todos os poetas
E os pensamentos de todos o filósofos,
Que as cousas sejam realmente o que parecem ser
E que não haja nada que compreender.

Sim, eis o que os meu sentidos aprenderam sozinhos: -
As cousas não têm significação: têm existência
As cousas são o único sentido oculto das cousas.

Aberto Caeiro

Conclusões sobre mim mesmo

Sou muito melhor escrevendo que desenhando
parece-me que nenhuma forma de expressão visual me cabe,
nada de fotografias filosóficas, desenhos metafísicos ou esculturas abstratas
a tinta que uso é a da caneta, o barro que moldo é o pensamento e a palavra
dessa forma, a única para mim possível acredito eu, tento passar pra tela as minhas impressões do mundo

Eu não sou apenas o que os sentidos me dizem,
somente os gostos, cheiros, sons, imagens, texturas não me tornam quem sou
eles, os sentidos, são a causa de mim, e eu, resultado deles e do senso crítico inerente a todos.